segunda-feira, 16 de julho de 2007

Novas Regras para Atos de Concentração

Dois aspectos do substitutivo ao projeto de lei que reformula o chamado Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência têm sido destacados na imprensa: a criação da Superintendência-Geral, cujas atribuições são herdadas da Secretaria de Direito Econômico, mas reformuladas, e a instituição da análise prévia de atos de concentração, em substituição à sistemática atual que, como regra geral, confere autonomia às empresas envolvidas enquanto aguardam decisão final do Cade.

A tarefa está muito além das minhas capacidades, mas vou tentar esmiuçar parte das mudanças em discussão, que, creio, será acalorada.

Critério de submissão de Atos de Concentração (ACs)

É abandonado o critério de participação no mercado relevante para notificação de ACs, o que é aparentemente bom, pois a definição de mercado relevante é controversa (para não dizer subjetiva).
É aparentemente porque não se sabe se os critérios objetivos, baseados no faturamento realizado, darão "conta do recado".
Devem ser notificados os ACs em que um dos grupos envolvidos tenha faturamento bruto ou volume de negócios no Brasil de pelo menos R$ 400 milhões "e" e o outro grupo tenha faturamento bruto no país ou volume de negócios no Brasil de pelo menos R$ 30 milhões.
A introdução da condição de minimis é boa por razões óbvias. Mas o valor em si faz sentido?

O problema realmente grande é a utilização do termo grupo. O que é grupo? Qual participação no capital social (ações ordinárias, acordo de acionistas?) que define um grupo?
A Superintendência-Geral (SG)

O Superintendente-Geral é nomeado pelo Presidente da República, uma vez aprovado pelo Senado, para um mandato de dois anos, com possibilidade de uma única recondução para igual período. Cabe à SG instruir os ACs.

- Primeira etapa: vinte dias após a notificação, a SG proferirá (I) "decisão terminativa, quando o processo dispensar novas diligências ou nos casos de menor potencial ofensivo à concorrência, assim definidos em resolução do CADE"; ou (II) "determinará a realização da instrução complementar, especificando as
diligências a serem produzidas"
A definição de casos com menor potencial ofensivo à concorrência depende de resolução a ser exarada pelo Cade.
- Segunda etapa: cinqüenta dias após a notificação, a SG "poderá emitir decisão fundamentada declarando a operação como complexa e determinará a realização de instrução complementar, especificando as diligências a serem produzidas" e concluídas num prazo máximo de até noventa dias da notificação .
Parece uma etapa intermediária. Na primeira etapa, a SG pode estar convicta de que se trata de um caso simples ou pode ter dúvidas e determinar uma primeira instrução complementar. Na segunda etapa, a SG estabelece a convicção de que realmente o caso é complexo.
- Terceira etapa: a contar da notificação, em quarenta dias (instrução simples) ou em cem dias (instrução complexa), prorrogáveis por mais trinta dias, a SG proferirá decisão pela aprovação do AC ou oferecerá impugnação do AC perante o Tribunal (Cade).
A SG pode impugná-lo, "caso entenda que o ato deva ser rejeitado, aprovado com restrições ou que não existam elementos conclusivos quanto aos seus efeitos no mercado". Incompreensível a impugnação do AC diante da inexistência de elementos conclusivos quanto aos seus efeitos no mercado.
O Tribunal

Nos mesmos moldes do Cade, é composto pelo Presidente e seis Conselheiros nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado. Têm agora mandato improrrogável de quatro anos.

- Atuação em casos com sugestão de aprovação pela SG.

Quando a decisão da SG for pela aprovação do AC, em quinze dias a contar da decisão da SG ao final da primeira etapa ou ao final da terceira etapa, o Tribunal poderá avocar o processo para julgamento, mediante provocação de um dos Conselheiros. Cabe também recurso de terceiro interessado ao Tribunal contra decisão da SG, a ser interposto no mesmo prazo.
A interposição de recurso faculta ao Conselheiro-Relator determinar à SG a realização de instrução complementar. Não consta do substitutivo o prazo para que ela seja concluída.
Em até vinte dias contados a partir da conclusão da instrução complementar elaborada pela SG, "o Conselheiro-Relator determinará a inclusão do processo em pauta para julgamento, se entender concluída instrução."
E se entender que a instrução não está concluída? O Conselheiro-Relator pode determinar novas instruções? Também não está claro se esse prazo é aplicada às situações em que o Conselheiro-Relator não determinou instrução complementar.
- Atuação em casos com sugestão de restrições pela SG.

As empresas podem oferecer ao Tribunal sua manifestação contrária à decisão da SG, no prazo de trinta dias a contar do final da terceira etapa.

No prazo de vinte dias contados da impugnação do AC pela SG, o Conselheiro-Relator incluirá o caso na pauta para julgamento ou determinará a realização de instrução complementar pela SG.
Não consta do substitutivo o prazo para que a instrução complementar seja concluída.

Há uma contradição:
se as empresas têm 30 dias para se manifestarem, o Conselheiro-Relator não pode ser obrigado a incluir o caso na pauta para julgamento em vinte dias (ambos os prazos contados a partir da publicação da impugnação pela SG).
Se entender concluída a instrução complementar, "o Conselheiro-Relator determinará a inclusão do processo em pauta para julgamento."
E se a instrução não for concluída no entendimento do Conselheiro-Relator? Pode mandar refazer? Qual o prazo?
Outras Questões

Aprovação tácita: o descumprimento dos prazos previstos implica a aprovação tácita do AC.

Suspensão dos prazos: os prazos não podem ser suspendidos ou interrompidos por qualquer motivo, exceto: a) por falta de quorum (quatro membros); b) caso a SG, antes de impugnar o AC, decida negociar com os interessados acordo visando estabelecer as condições para sua aprovação. O Conselheiro-Relator participará do processo de negociação do acordo, que deverá ser submetido ao Tribunal para aprovação em trinta dias.

3 comentários:

  1. Blogger, como leigo, só posso dizer que nada disso faz sentido. Nunca consegui entender por que para julgar um processo é necessário envolver dois ministérios e uma autarquia. Não criaram o tal do CADE só para isso? Não faria sentido que um só órgão tivesse um corpo técnico capaz de analisar os processos que seriam então julgados por um colegiado (mas tudo dentro da mesma instituição)? A impressão que eu tenho é que quanto mais complicado fica mais gente ganha dinheiro com isso... É aquela velha história: por que simplificar se a gente pode complicar, né?

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  2. Ganha-se muito pouco com tudo isso. O trabalho é mais por diversão.
    Saudações.

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  3. Pois é João, por outro lado perdem os administrados que na maioria das vezes são obrigados a trabalhar frente aos três órgãos concomitantemente e o próprio SBDC que acaba duplicando (quando não triplicando) suas tarefas com seus recursos humanos já tão notoriamente escassos.

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