sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Atos de Concentração e a Superintendência-Geral na Lei 12.529/11 (*)


A nova lei de defesa da concorrência trouxe a possibilidade de aprovação de atos de concentração (ACs) ainda no âmbito da Superintendência-Geral (SG), sem a obrigatoriedade da apreciação destes pelo Tribunal (arts. 54 e 57).

Ao longo da tramitação do projeto de lei no legislativo, essa possibilidade deu margem a uma fundamentada preocupação, associada à concentração de poder em torno do superintendente e à eliminação da natureza colegiada das decisões proferidas pelo plenário do Cade (agora denominado Tribunal).

O texto final da Lei 12.529/11 parece ter estabelecido "travas" apropriadas e suficientes, uma vez que as decisões de aprovação de ACs pelo superintendente podem ser revistas pelo Tribunal, seja por recurso de qualquer terceiro interessado, seja por iniciativa de um dos conselheiros (art. 65).

Superada a preocupação inicial, persistem ao menos duas outras, talvez menores, sobre as relações entre SG e Tribunal. Faz-se referência aos prazos internos para instrução de casos complexos pela SG e às atribuições para negociação de "remédios" para aprovação de ACs.

Em versões anteriores do projeto de lei, tinham sido estabelecidos vários prazos internos a serem observados pela SG na instrução de ACs, o que acabava por reservar certo período para apreciação deles pelo Tribunal. A Lei 12.529/11, no entanto, eliminou-os. Afora o prazo máximo de 240 dias para a decisão final, a contar da notificação ou de sua emenda, não há previsão na lei de um prazo limite para que a SG decida-se pela aprovação ou impugnação do AC. Assim, em tese, a decisão pode chegar ao Tribunal no limite dos 240 dias, preservando apenas os prazos mínimos a serem observados pelo próprio Tribunal (1). A depender do período de instrução, cuja extensão depende apenas da SG, pode ser razoavelmente exíguo o tempo disponível para que o Tribunal conheça e eventualmente instrua o processo antes da  decisão final. 

É correta a eliminação de múltiplos prazos internos, muitos dos quais referentes a andamentos processuais de menor importância, que poderiam engessar a instrução. Todavia, o prazo limite para remissão do processo ao Tribunal não pode ser decidido discricionariamente pela SG.

Quanto aos "remédios" para aprovação de ACs, o texto aprovado pela Câmara (art. 92) dispunha que a SG poderia negociar "Acordos em Controle de Concentrações" (ACCs), a nova e infeliz denominação do termo de compromisso de desempenho. A negociação ocorreria antes da impugnação do AC pelo superintendente e teria a participação do conselheiro-relator. Eventual acordo seria submetido ao Tribunal para aprovação. O artigo foi vetado, de forma que resta na Lei apenas a declaração geral de competência dos conselheiros (art. 11) e da SG (art. 13) para propor e do plenário do Tribunal (art. 9º) para decidir pela aprovação dos ACCs. Não há, portanto, uma divisão de atribuições entre SG e conselheiros para condução de negociações de "remédios", nem a definição do momento processual de seu início, fatos que trazem incertezas para as partes envolvidas e, possivelmente, ineficiências. 

Pensando em uma possível regulação do procedimento pelo Tribunal, convém eliminar a hipótese de as partes interagirem simultaneamente com dois interlocutores, SG e conselheiro-relator, sem que haja uma relação hierárquica definida. Ademais, assim como ocorre em outras jurisdições, a divulgação de um sumário das preocupações concorrenciais vislumbradas e dos possíveis "remédios" (statement of objections) é importante para que as partes possam engajar-se na proposição de uma solução tendo um mínimo de clareza acerca das questões envolvidas. Seria interessante que isso fosse feito antes da impugnação da operação pela SG, resguardando o momento seguinte, já no âmbito do Tribunal, para o eventual aperfeiçoamento do acordo alcançado na SG.

(*) Publicado em IBRAC. Suplemento Eletrônico da Revista do IBRAC. Ano III, nº 1, 2012.
(1) Principalmente, os 30 dias previstos para que as empresas envolvidas ofereçam defesa contra a decisão de impugnação pela SG e os 15 dias para interposição de recurso por terceiros ou avocação pelo Tribunal de decisões da SG pela aprovação do AC.

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