quarta-feira, 21 de março de 2007

Entrevista

Três perguntas para Alessandro Oliveira, coordenador do Núcleo de Estudos em Competição e Regulação do Transporte Aéreo, do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA):

1. A "proposta" de liberalização da participação de capital estrangeiro em empresas aéreas nacionais, atualmente restrita legalmente a 20%, tem sido mencionada com freqüência na imprensa. Qual sua opinião sobre isso?

Aumentar os limites de participação estrangeira significa aumentar a contestabilidade no setor, ou, em outras palavras, significa incrementar a concorrência potencial nos mercados aéreos domésticos - maior participação de capital estrangeiro significaria que novas empresas podem ser constituídas com novo capital, e pleitear acesso ao mercado. Do ponto de vista do bem-estar do consumidor, isso é positivo.

Haveria também um fortalecimento das incumbentes, via maior possibilidade de investimento estrangeiro, e melhoria da governança corporativa, transparência das gestões etc. Esse é um fator que, aliás, já vem sendo alavancado ultimamente, independente dessa regra. Tam e Gol têm buscado alavancagem de financiamento internacional (e inclusive competindo por ele). Uma alteração de regra acentuaria essa corrida, o que, neste ponto de vista, seria bem-vista.

No limite, se essa restrição fosse demasiadamente relaxada, teríamos que o país estaria exposto à concorrência potencial de todo e qualquer capital estrangeiro e/ou companhia aérea pelo mundo afora. Penso que não deveríamos chegar a esse ponto, e portanto, dosar a regra do limite é importante. Sobretudo porque se trata de uma concessão de política externa, que deve ter contrapartidas. Além disso, em tese, a escala do mercado doméstico é muito reduzida, o que coloca as companhias domésticas em desvantagem.

2. O turismo externo para o Brasil parece ter padecido com a redução da disponibilidade de vôos para o país. Faltaram planejamento e disposição por parte do governo brasileiro no sentido de facilitar a transição das linhas operadas pela Varig para as demais empresas aéreas brasileiras? Ou, sendo mais radical, a perda com a crise da Varig pode ter superado o ônus dela decorrente?

A crise da Varig foi um evento extremamente complicado, em um período que a Anac estava recém-constituída, com envolvimento da Justiça e de uma lei de falências recente etc. O ideal seria a transição das linhas, caso a empresa de fato deixasse de operar. Na medida em que ela entra em uma regra de falência, e que a perda de alguns daqueles mercados (internacionais e domésticos) poderia comprometer a viabilidade de todo o arcabouço de proteção à empresa em dificuldade, a situação fica bem mais complexa. O quanto a perda dos slots em Congonhas inviabilizaria totalmente o processo de recuperação da Varig? É claro que esse tipo de questão gera barreiras à saída, o que é prejudicial ao mercado. Mas, uma vez que existe um ordenamento jurídico com esta intenção, o que o regulador deve fazer é inserir essa restrição no problema de maximização do bem-estar do setor.

3. Como usuário contumaz da ponte aérea Rio-São Paulo observo inúmeras vezes aviões da Tam e da Gol, por exemplo, levantando vôo simultaneamente (quase simultaneamente, é claro) com baixíssima ocupação. Operar a ponte aérea, especialmente em horários de menor movimento, em regime de consórcio não faz mais sentido econômico, com prováveis benefícios inclusive para os consumidores? Ou os ganhos advindos da concorrência podem superar a perda de eficiência operacional?

As alianças visam sempre arrefecer a concorrência e/ou promover ganhos de eficiência. No caso da concorrência, ela pode ser arrefecida com colusão tácita, ainda mais se houver fortes barreiras à entrada. Como Congonhas está "slotado" e congestionado, com certeza temos um ambiente propício para colusao. A existência de excesso de capacidade é conseqüência de um jogo entre as companhias, cujo objetivo é a liderança no mercado, além da busca pela captura do passageiros time-sensitive e por eficiência operacional (colocar o máximo de aeronaves no ar pelo máximo numero de horas possível).

Acredito, que eficiência operacional não seria o objetivo principal de uma eventual operação conjunta na ponte aérea, pois as companhias estão atualmente "vidradas" com a produtividade das aeronaves (no sentido de horas voadas, ou assentos oferecidos e não necessariamente no numero de passageiros transportados). Como a densidade de tráfego da ponte é altíssima e a demanda por traer no país já é crescente, elas não perdem tanto, em termos de produtividade, em ter um pouco mais de ociosidade em certos horários, ainda mais se isso tiver a funcionalidade de ter capacidade suficiente em caso de choques que empurrem a demanda para cima. Na ponte é melhor ter alguns assentos adicionais vazios do que ter todos ocupados e perder receitas de uma demanda adicional para a concorrência.

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